Sempre imaginei que o paraíso fosse uma espécie de livraria.
Jorge Luís Borges

O Clube de Leitura dá as boas vindas a todos os leitores que queiram partilhar essa experiência única que é ler. Se tens alguns textos da tua autoria ou de autores de que gostes em especial, envia-os para eb23ms.clubedeleitura@gmail.com.

sábado, 13 de dezembro de 2008


A felicidade é feita de pequenas coisas, como a família e os amigos, por isso ser-se feliz é fácil, apenas precisamos de dar importância ao insubstituível, que são os que nos rodeiam. Quem não valoriza a família valoriza os seus bens e, apesar de rico, é infeliz por fora, inevitavelmente. É por isso que alguns não se sentam felizes, apenas valorizam o fútil, o superficial, que os torna ricos, mas pobres.
A felicidade dá-se quando as nossas expectativas e ambições se encontram com a realidade. Aí, sentimos afecto pelo trabalho que fizemos e satisfação pelo que conseguimos construir com as nossas mãos, o nosso suor. A esse sentimento chamamos felicidade.
A felicidade tem, para cada pessoa, um significado. Para um agricultor, uma simples colheita, é de uma importância banal, é importante que essa mesma colheita nasça e renasça, e entre uma colheita e outra e outra há muita felicidade.
Para outros, a felicidade está num presente, num jarro, num relógio… em pequenas coisas que contribuem para um bem melhor, que somos nós.
O conto “História da Gata Borralheira”, de Sophia de Mello Breyner Andresen, mostra-nos que a riqueza não é tudo, que a riqueza tem um preço, não dinheiro, mas sim algo mais abstracto, mais interno, que é a nossa alma, a nossa dignidade, e que a vida de riqueza, de aparências não se compara à vida pobre e digna, que pode não nos satisfazer materialmente, mas que nos dá aquilo de que nós precisamos e nada mais.
A felicidade encontra-se em nós, mas as decisões que tomamos é que a suprimem ou a libertam.


Guilherme Estrela, 8ºD

Na nossa opinião, a felicidade depende de todas as circunstâncias, de tudo o que nos rodeia e da educação, sobretudo problemas no seio familiar.
Se vivermos numa casa onde haja conflitos constantes entre os familiares, isso é prejudicial para o seu bem-estar e felicidade. Esta atinge-se quando as pessoas que nos rodeiam são felizes para nos transmitirem o seu bem-estar.
A felicidade existe, basta nós querermos tê-la e construí-la. Para sermos felizes, basta amar e ser amado.
Relativamente ao conto “História da Gata Borralheira”, de Sophia de Mello Breyner Andresen, pensamos que Lúcia estava errada em relação à felicidade, pois ela pensava que o dinheiro lhe traria toda a aquela que precisasse.


João, André e Constança Raquel - 8ºD

Ser feliz é estarmos ao lado das pessoas que amamos quando estes precisam de nós, partilhar com os outros as partes únicas da nossa vida.
A felicidade não nasce connosco, temos de conquistá-la durante o nosso dia-a-dia para sermos realmente felizes. Em circunstâncias idênticas, uns sentem-se felizes e outros não, sendo que cada um tem os seus horizontes e uma maneira de ver a vida.
Existem várias maneiras de exprimir a felicidade. Às vezes, um simples sorriso demonstra uma alma cheia de alegria. A felicidade atinge-se quando concretizamos todos os nossos sonhos.
Esta é a nossa opinião sobre um tema abstracto. No conto “História da Gata Borralheira”, de Sophia de Mello Breyner Andresen, Lúcia era feliz e não sabia. Quando pensou ter encontrado a felicidade, estava a afundar-se num barco do qual nunca conseguiria sair.


Sara, Lisandra, Ana, Cheila - 8ºD

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

O SAL E A ÁGUA


Um rei tinha três filhas; perguntou a cada uma delas por sua vez, qual era a mais sua amiga. A mais velha respondeu:
– Quero mais a meu pai, do que à luz do Sol.
Respondeu a do meio:
– Gosto mais de meu pai do que de mim mesma.
A mais moça respondeu:
– Quero-lhe tanto, como a comida quer o sal.
O rei entendeu por isto que a filha mais nova o não amava tanto como as outras, e pô-la fora do palácio. Ela foi muito triste por esse mundo, e chegou ao palácio de um rei, e aí se ofereceu para ser cozinheira. Um dia veio à mesa um pastel muito bem feito, e o rei ao parti-lo achou dentro um anel muito pequeno, e de grande preço. Perguntou a todas as damas da corte de quem seria aquele anel. Todas quiseram ver se o anel lhes servia: foi passando, até que foi chamada a cozinheira, e só a ela é que o anel servia. O príncipe viu isto e ficou logo apaixonado por ela, pensando que era de família de nobreza.
Começou então a espreitá-la, porque ela só cozinhava às escondidas, e viu-a vestida com trajes de princesa. Foi chamar o rei seu pai e ambos viram o caso. O rei deu licença ao filho para casar com ela, mas a menina tirou por condição que queria cozinhar pela sua mão o jantar do dia da boda. Para as festas de noivado convidou-se o rei que tinha três filhas, e que pusera fora de casa a mais nova. A princesa cozinhou o jantar, mas nos manjares que haviam de ser postos ao rei seu pai não botou sal de propósito. Todos comiam com vontade, mas só o rei convidado é que não comia. Por fim perguntou-lhe o dono da casa, porque é que o rei não comia? Respondeu ele, não sabendo que assistia ao casamento da filha:
– É porque a comida não tem sal.
O pai do noivo fingiu-se raivoso, e mandou que a cozinheira viesse ali dizer porque é que não tinha botado sal na comida. Veio então a menina vestida de princesa, mas assim que o pai a viu, conheceu-a logo, e confessou ali a sua culpa, por não ter percebido quanto era amado por sua filha, que lhe tinha dito, que lhe queria tanto como a comida quer o sal, e que depois de sofrer tanto nunca se queixara da injustiça de seu pai.
Teófilo Braga, Contos Tradicionais do Povo Português

O BOI CARDIL


Um rei tinha um criado, em quem depositava a maior confiança, porque era o homem que nunca em sua vida tinha dito uma mentira. Recebeu o rei um presente de boi muito formoso, a que chamavam o boi Cardil; o rei tinha-o em tanta estimação que o mandou para uma das suas tapadas acompanhado do criado fiei para tratar dele. Teve uma ocasião uma conversa com um fidalgo, e falou da grande confiança que tinha na fidelidade do seu criado. O fidalgo riu-se:
– Porque te ris? – perguntou o rei.
– É porque ele é como os outros todos, que enganam os amos.
– Este não!
– Pois eu aposto a minha cabeça como ele é capaz de mentir até ao rei.
Ficou apostado. Foi o fidalgo para casa, mas não sabia como fazer cair o criado na esparrela e andava muito triste. Uma filha nova e muito formosa, quando soube a causa da aflição do pai, disse:
– Descanse, meu pai, que eu hei-de fazer com que ele há-de mentir por força ao rei.
O pai deu licença. Ela vestiu-se de veludo carmesim, mangas e saia curta, toda decotada, e cabelos pelos ombros e foi passear para a tapada; até que se encontrou com o rapaz que guardava o boi Cardil. Ela começou logo:
– Há muito tempo que trago uma paixão, e nunca te pude dizer nada.
O rapaz ficou atrapalhado e não queria acreditar naquilo, mas ela tais coisas disse e jeitinhos deu que ele ficou pelo beiço. Quando o rapaz já estava rendido, ela exigiu-lhe que, em paga do seu amor, matasse o boi Cardil. Ele assim fez e deu-se por bem pago todo o santíssimo dia.
A filha do fidalgo foi-se embora, e contou ao pai como o rapaz tinha matado o boi Cardil; o fidalgo foi contá-lo ao rei, fiado em que o rapaz havia de explicar a morte do boi com alguma mentira. O rei ficou furioso quando soube que o criado lhe tinha matado o boi Cardil, em que punha tanta estimação. Mandou chamar o criado.
Veio o criado, e o rei fingiu que nada sabia; perguntou-lhe
– Então como vai o boi?
O criado julgou ver ali o fim da sua vida e disse:
Senhor! pernas alvas
E corpo gentil,
Matar me fizeram
Nosso boi Cardil.
O rei mandou que se explicasse melhor; o moço contou tudo. O rei ficou satisfeito por ganhar a aposta, e disse para o fidalgo:
– Não te mando cortar a cabeça como tinhas apostado, porque te basta a desonra de tua filha. E a ele não o castigo porque a sua fidelidade é maior do que o meu desgosto.
Teófilo Braga, Contos Tradicionais do Povo Português

Se tivesse um mês de vida...


Sei que tudo mudava... nada nunca mais seria igual... todo o tempo me iria parecer curto, iria querer lutar por fazer num mês tudo o que não fui capaz de fazer em anos. Diria do fundo do coração aquilo que sinto, que sempre omiti, que nunca fui capaz de aceitar. Talvez o medo de tentar ou simplesmente falta de coragem. Mas, sinceramente, se tivesse um mês de vida, faria aquilo que nunca pude, aquilo que a mim mesma disse proibido.

Não perderia tempo a chorar, a lamentar... talvez no início acontecesse, mas tenho a certeza que, mais do que nunca, a força que sempre interiorizei se iria soltar. Passaria os dias a sorrir, a observar o mar, os amigos... amigos, amigos que comigo sorriram, choraram, abraçaram, sonharam, caminharam, amigos que em todos os momentos estiveram presentes, me deram a mão, apoiaram e caminharam comigo. Mas desta vez não... desta vez tinha a noção de que iria caminhar sozinha... sozinha para outro lugar, lugar esse que desconheço. Um mês.. e aquilo que vivi, que aprendi até agora?! Realmente alguém disse e tinha razão: "A única coisa certa que temos é a morte".

Começaria por dizer que te amo, sim, amo... e claro que não te considero o homem da minha vida, mas, de momento, és tu que me fazes sorrir, olhar, pensar, amar, foste tu que, apesar de me magoares, também me proporcionaste grandes momentos, é a ti que devo muito do que sei, do que aprendi... e mais do que amor, és amigo, amigo de verdade.

De seguida, talvez me sentasse à conversa com os quatro melhores amigos que já fiz. Não iriam compreender, eu sei, se fosse ao contrário, eu não aguentava, eu também quereria ir. Mas não, nunca iria permitir que eles viessem comigo... podeiam chorar a minha morte, podiam gritar, mas comigo não vinham!

Ainda tinham muito que viver e, apesar de ser insubstituível, de alguma forma, queria que ficassem, que vivessem, que voltassem a sorrir! Os outros amigos sucediam depois e aí, aí seria mais difícil ainda... Como poderia eu dizer às pessoas que amo que ia partir sem as magoar? Ia custar tanto... o coração a mil à hora, a face desfeita em lágrimas, pernas a caminhar, mas no sentido do recuo, forças a esgotar e vontade de desistir. Família, amigos, conhecidos, amores... todas as pessoas importantes, ali, a olhar para mim, a sofrer por mim, a chorar por mim. Impotência... a melhor palavra que define o que eu sentiria ao vê-los assim!

Se tivesse um mês de vida, iria passá-lo com o que de mais maravilhoso existe na vida... as pessoas que amo e que me amam! Sinceramente, pergunto-me: Mas se eu sei que pode acontecer daqui a um mês, amanhã, ou mesmo hoje, por que não o faço agora? Por que não deixo as pessoas que amo com palavras bonitas todos os dias? Por que continuo a perder tempo com discussões e zangas, se o tempo é curto e eu nem sei até que ponto?

A única resposta que obtenho é que não sou perfeita, ninguèm é e, muitas vezes, aquilo que queremos fazer não corresponde ao que fazemos, aquilo que queremos sentir não corresponde ao que sentimos, pois não somos nós que comandamos, é o coração! Embora tenhamos noção de que pode acontecer, o medo de tentar incapacita-nos de o fazer...


Ana Filipa Rodrigues, 9º B

A Morte, Tão Perto

Saber que a morte

Está perto

Saber que a morte

Está a meu lado

É tão triste

Tão arrepiante

Tão assustador

Temia-a

Temia a sua imprevisibilidade

Temia a sua dor

Temia ter que ir

Temia esquecer uma vida

Agora

Já não a temo

De que me vale?

Está perto

Nada posso fazer

O destino está definido

O livro

Está escrito

A morte caminha lentamente

Em minha direcção

E nada posso fazer

Escolheu-me, porquê?

Pode ser que haja uma resposta

Para todas as minhas questões

No paraíso, para lá dos céus

Onde me espero encontrar

Depois de adormecer

E nunca mais acordar.

Por agora

Nada mais me resta fazer

Senão

Perdoar e o perdão implorar

Amar e o amor oferecer

Rir para não chorar

Viver intensamente

A preciosa claridade

E a assustadora noite

Mas magnífica

Que me oferece um luar intenso

Para ver e amar

Não vou lamentar

Não me vou arrepender

Não me vou preocupar

Vou viver, amar

Aconchegar, observar

Descobrir novas emoções

Relembrar a felicidade

E abandonar a tristeza

E no momento de ir

Irei

E no momento de adormecer

Nunca mais acordarei.

Agora

Dou mais valor à vida

Dou valor ao facto de poder acordar

Todos os dias

Dou valor ao facto

De amar e ser amada

De poder estar com os que amo

E lhes poder dizer o quanto os amo

Dou valor à luz, ao sol

Dou valor à noite, ao luar

Dou valor ao trigo e à água...



Joana Vidigal, 9ºB

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O Príncipe Feliz


Bem no alto da cidade, por sobre um enorme pedestal, lá estava a estátua do Príncipe Feliz. Toda ela era revestida por finas folhas do mais puro ouro, por olhos tinha duas brilhantes safiras, e na bainha da sua espada brilhava um enorme rubi vermelho.
Uma noite, uma pequena Andorinha sobrevoou a cidade. Foi então que avistou a estátua no alto do pedestal.
«Quem és tu?» perguntou.
«Eu sou o Príncipe Feliz.»
«Nesse caso, porque choras?» retorquiu a Andorinha; «encharcaste-me.»
«Quando era vivo e tinha um coração humano,» respondeu a estátua, «desconhecia o que eram as lágrimas, porque vivia no palácio da Alegria, onde a tristeza não podia entrar. Os meus cortesãos chamavam-me o Príncipe Feliz, e feliz eu era, se é que o prazer dá felicidade.
Assim, vivi, e assim morri. E agora que estou morto, puseram-me aqui tão alto que posso ver toda a tristeza e toda a miséria da minha cidade. E embora o meu coração seja de chumbo, não posso deixar de chorar.
Ao longe, continuou a estátua numa voz baixa e musical, ali ao longe, numa rua pequena, está uma casa pobre. Uma das janelas está aberta e por ela vejo uma mulher sentada a uma mesa. Num canto do quarto, numa cama, está o seu filho doente. Tem febre e pede laranjas. Mas a sua mãe apenas lhe pode dar água do rio, e por isso ele chora. Andorinha, Andorinha, minha Andorinha, levas-lhe o rubi que se encontra na minha bainha? Os meus pés estão presos a este pedestal e não posso sair daqui.»
E a Andorinha lá entrou e pousou o grande rubi na mesa, junto do dedal da mulher.
«Andorinha, Andorinha, minha Andorinha,» disse o Príncipe, «lá ao longe, no outro extremo da cidade, vejo um jovem num sótão.
Ele está a tentar acabar uma peça para o Director do Teatro, mas está demasiado frio e ele já não consegue escrever mais. Já não há lenha na lareira, e a fome até o fez desmaiar.»
«Ficarei contigo mais uma noite,» disse a Andorinha que, no fundo, tinha bom coração. «Queres que lhe leve outro rubi?»
«Ai! Infelizmente já não tenho mais rubis,» respondeu o Príncipe: «os meus olhos são tudo o que me resta. São feitos de safiras raras, que foram trazidas da índia há mil anos. Tira uma delas e leva-lha. Ele vendê-la-á ao ourives, e com o dinheiro que conseguir comprará lenha e acabará a sua peça.»
«Naquela praça,» respondeu o Príncipe Feliz, «está uma pequena vendedora de fósforos. Ela deixou cair os fósforos na sarjeta e eles estragaram-se. O pai dela bater-lhe-á se ela regressar a casa sem dinheiro, e é por isso que ela está a chorar. Ela está descalça, sem sapatos e sem meias, e não tem nada que proteja a sua cabeça. Arranca o meu outro olho, dá-lho, e assim o pai dela não lhe baterá.»
«Ficarei contigo mais algum tempo,» disse a Andorinha, «mas não arrancarei o teu olho. Assim ficarás completamente cego.»
«Andorinha, Andorinha, minha Andorinha,» retorquiu o Príncipe, «faz o que te digo.» (...)
«Querida Andorinha,» disse o Príncipe, «falas-me de coisas espantosas, mas o mais espantoso de tudo é o sofrimento dos homens e das mulheres. Não existe um Mistério tão grande como a infelicidade. Voa sobre a minha cidade, Andorinha, e diz-me o que vês.»
E a Andorinha voou então por sobre a grande cidade e viu como os ricos se divertiam nas suas casas enquanto os mendigos permaneciam sentados aos portões. Voou até às mais escuras vielas e viu os rostos lívidos das crianças esfaimadas, que olhavam fixamente as negras ruas. Por baixo do arco de uma ponte, dois rapazinhos estavam deitados, abraçados um ao outro tentando manter-se quentes. «Temos tanta fome!» exclamaram. «Não podem ficar aqui!» gritou o guarda nocturno, e lá foram eles para o meio da chuva.
E a Andorinha voltou e contou ao Príncipe o que tinha visto.
«Estou coberto com puro ouro», disse o Principe, «arranca-o, folha a folha, e dá-o aos meus pobres; os vivos estão convencidos de que o ouro traz a felicidade.»
E a andorinha arrancou folha por folha daquele ouro puro, até que por fim o Príncipe Feliz acabou por ficar cinzento e feio. Folha por folha daquele ouro puro a Andorinha levou aos pobres da cidade, e as caras das crianças ficaram mais rosadas, e elas brincavam e dançavam nas ruas e gritavam «agora temos pão!».
Na manhã seguinte, bem cedinho, o Prefeito passeava pela praça na companhia dos vereadores. Quando passaram pelo pedestal, ele olhou para cima: «Valha-me Deus! Que feio que está o Príncipe Feliz!»
A estátua foi então derretida numa fornalha.


Oscar Wilde, O Príncipe Feliz e Outras Histórias (adaptado)